sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

O MUNDO ACABA AGORA E EU ESTAREI DANÇANDO


"O mundo acaba agora e eu estarei dançando"
Pitty



As vezes perco as contas de quantas vezes fui ao Rock In Rio, e por mais estranho que isto possa parecer, as vezes tenho essa mesma sensação em relação ao final do mundo.

Participei, por exemplo, do notório final do mundo no ano 2000. Esse era para ser grandioso, mas ficou enfraquecido depois de alguém fazer a regressão e ver como funcionava a contagem dos anos descobrindo que faltava um século entre o 1a.C. e o 1 d.C. (o que seria o Século Zero). A tensão só aumentou com o novo cálculo porque tivemos um novo fim do mundo em 2001. Mas o mundo não acabou, nem num, nem noutro. Por outro lado o mundo como conhecíamos mudou completamente, já que o Bug do Milênio fez com que os EUA investisse pesado na computação na Ásia, o que desenvolveu as telecomunicações e a informática naquela região, historicamente preparada intelectualmente para desafios matemáticos, mudando a forma de fazer negócios no mundo. Foi este movimento que colocou em prática o modelo de Mundo Plano, a tal globalização de que falamos até hoje.

Também participei de outros finais de mundo menos nobres, mas também divertidos como o 9/9/99 o 8/8/88 e assim por diante, sendo que deixamos passar desapercebida a belíssima possibilidade de fim de mundo no 12/12/12 as 12 hora e 12 minutos, 12 segundos e 12 centésimos, uma sequencia numérica que, se não me falhar a matemática - pois não sou asiático -, só voltará a ocorrer em 01/01/2101.

Agora que comecei a rememorar, lembrei do admirável fim do mundo da passagem do cometa Halley pela Terra (1985-86). Esse sim, cercado de duvidas, lendas e desinformação em um mundo menos conectado e com algum domínio do espaço. Esse fim do mundo em particular foi especialmente acompanhado por muitos trechos das profecias de Nostradamus que, como todas as profecias de Nostradamus, sempre me pareceram que tanto poderiam ser aplicadas ao final dos tempos quanto à lista de compras de supermercado de dona Dirce, ou sobre o diagnóstico da doença do cavalo do seu Pedro, ou uma letra de musica de Zé Ramalho, um poema de Poe escrito em sânscrito.

O que temos de fato é que nem mesmo o calendário que utilizamos para marcar os finais de mundo é real. O tempo, como todos conhecemos, é uma divisão mais ou menos precisa de ciclos naturais como achava Newton, e pode ser nem isso se considerarmos as formulações de Einstein. Nosso calendário é furado, não sabemos se temos 4 ou 4,5 bilhões de anos, e convenhamos que 500 milhões de anos de diferença não é pouca coisa. Os romanos alteraram o calendário duas vezes incluindo meses e reorganizando um ano completo, e nem mesmo o Ano Novo ocorre exatamente na hora estipulada nos anos que não sejam bissextos porque não consideramos o tempo correto de rotação do planeta (para você que não faz ideia, são 365 dias e 6 horas). Com tantas duvidas, fico ansioso pelo próximo fim do mundo, ainda não sei onde ou com quem vou estar, mas uma coisa é certa, quando o mundo acabar eu estarei dançando.

sexta-feira, 25 de maio de 2012

Frustação e o muro da realidade

“Os acessos de fúria são causados por uma convicção quase cômica de que determinada frustração não consta no contrato da vida. Gritamos quando não conseguimos algo que desejávamos porque em nosso mundo perfeito e particular algo indesejado por nós simplesmente não pode ocorrer."











A frustração é um choque entre nossos desejos e a realidade imutável. É como um muro rígido que aparece em nosso caminho e que julgamos, sob a ótica do momento, intransponível. Essa reação cômica (se analisada friamente) começa na infância, quando percebemos que as fontes de nossa satisfação estão além do nosso controle, e que o mundo não se ajusta aos nossos desejos de forma confiável. São inúmeros momentos na infância em que somos confrontados com nossa impotência diante dos fatos, e como estamos ainda nos adaptando ao modo de viver de todo o resto da humanidade, fica difícil entender onde está a lógica, ou onde foi que o mundo nos traiu.

De acordo com o filósofo Sêneca, a sabedoria plena é atingida quando “aprendemos a não agravar a inflexibilidade do mundo com nossas reações, nossos ataques de raiva, autopiedade, ansiedade, amargura, hipocrisia e paranóia”. Não parece fácil. Nossos instintos foram desenhados para agredir ao ser agredido, e uma ação contrária aos nossos desejos desencadeia um torrente de frustração, transformada nos ataques de raiva, autopiedade, ansiedade, amargura, hipocrisia e paranóia de Sêneca.

A função do autoconhecimento é nos preparar para que nossos desejos batam com a maior suavidade possível contra o muro inflexível da realidade, ou que ao chocarem-se contra este muro, saibam contorná-lo até o resultado esperado, sem traumas. Isso requer treino, mas acima de tudo vontade. A mudança ocorre primeiro e unicamente em nós, depois o mundo real vai lentamente e cada vez com maior freqüência, se adaptar (ou ser adaptado) aos nossos desígnios.

Quando não conseguimos encontrar alguma coisa, batemos portas, destruímos plantas, jogamos objetos na parede e esbravejamos. Mas o muro da realidade continua ali. Com um pouco de calma e algumas vezes uma boa dose de paciência e autoeducação constante, somos capazes de encontrar nossas chaves, desamarrar um nó, afrouxar um parafuso, abrir uma porta, estacionar um carro, conquistar um coração.

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Seleção natural e a vaga de estacionamento

A seleção natural acabou. Com o advento da medicina, o processo de seleção natural da espécie humana teve um abrupto final. Não escolhemos mais nossos parceiros entre os sobreviventes, os mais fortes, mas entre todo e qualquer um da raça humana. Não só os fortes sobrevivem, mas todos. Durante milhares de anos, nossas escolhas foram condicionadas ao universo restrito dos vencedores na luta cotidiana da sobrevivência. Dotados de observação acima do normal para qualquer espécie, desenvolvemos um cérebro capaz de criar cognições em diferentes cenários. talvez este seja um dos principais problemas que nos afetam como espécie: por uma questão de sobrevivência, nosso cérebro se desenvolveu em um período onde era necessário resposta imediata contra qualquer ameaça. Mas o mundo mudou.

Hoje temos tempo para pensar e dar respostas adequadas e adaptadas em um novo contexto muito menos agressivo. Ninguém morre devido a uma reação errônea, exceto em uma circunstancia anormal de violência, que, convenhamos, não deve s usada como parâmetro de comportamento em nenhuma avaliação racional. Num mundo hostil e agressivo, uma descarga de adrenalina quando confrontados com um risco iminente não era só necessária, mas vital. A agressividade oriunda dessa resposta química de um cérebro adolescente representou para nossos ancestrais a possibilidade de manter sobre a Terra seus descendentes. Mas hoje em dia, quando somos confrontados em uma reunião de trabalho ou no transito, nosso cérebro primitivo ainda entrega as mesmas respostas químicas que entregava ha milhares de anos atrás. Nosso coração dispara, o campo visual diminui, aumenta a oxigenação, e uma reação agressiva aflora, num contexto totalmente diferente das savanas africanas onde viveram os humanos primordiais.

É obvio que ninguém precisa de uma descarga de adrenalina porque seu colega de trabalho apontou alguns problemas no projeto que você está apresentando. Mas ela vem mesmo assim. Apesar de nossa evolução em termos de relações sociais e relações com a natureza, ainda temos a química do desespero e da insegurança a pulsar em nossas veias. A má noticia é que, com a estagnação da seleção natural, nosso cérebro deve permanecer irracional. Sei que você esta pensando que isso não é verdade, mas já reparou no desespero que toma conta das ruas quando uma tempestade de verão se aproxima? Todos sabemos que trata-se de um evento natural de condensação de água em estado gasoso, que tornara a ser liquida e, pelo peso, vai cair. Água não tem cheiro, não mancha, não tem gosto (acho que aprendi isso na escola), mas mesmo assim nosso cérebro primata nos coloca em desespero. Você já deve ter passado pela experiência de fazer compras em um supermercado quando estava com fome. Nesse momento somos totalmente animais, deixamos a racionalidade de lado e colocamos no carrinho tudo que seja possível, mesmo com uma pequena aura racional insistindo que isso esta acontecendo por causa da fome momentânea. Não adianta, seu cérebro de pós macaco quer comer, é a hora de caçar, quanto mais, melhor. Sem falar no mau humor que nos acomete quando estamos com fome, e, acredite, sou especialista nisso. A mensagem que seu cérebro envia ao corpo subnutrido é "vai lá, derruba, mata e come...ataca!". Em nosso período de formação como espécie, durante o processo evolutivo interrompido, era impossível ser racional e ter fome ao mesmo tempo. Maslow provou que a segurança vem após a sobrevivência em sua famosa pirâmide. Coisas de seu cérebro de macaco.

Se em um futuro completamente distante seremos capazes de domar as descargas de adrenalina e as reações infantis de nosso cérebro estagnado, isso será a melhor possibilidade de sobrevivência da raça humana. No entanto, a perder nossa agressividade e competitividade naturais do cérebro primata, provavelmente perderemos as demais alegrias que esse defeito natural nos causa. A sensação da vitória, a conquista, o prazer. É possível que um processo de seleção baseado em condições econômicas e não mais em condições naturais esteja em andamento, mas como todo ser participante de um processo histórico, temos muita dificuldade em enxergar isto. Talvez em um futuro qualquer, daqui a milhões de anos, nosso cérebro tenha finalmente encontrado o caminho da tolerância, do amor fraternal, do entendimento racional, do debate socrático. Ate lá, quando alguém roubar sua vaga no estacionamento do supermercado, desça da sua arvore e quebre a cara dele. Afinal, seu cérebro gosta das coisas como se fazia antigamente.