sexta-feira, 26 de julho de 2013

Comentário a respito de Eric

Quando leio um artigo em um blog qualquer relatando uma entrevista com Eric Hobsbawm, feita há dois anos, fico em silêncio por uns minutos pensando em como continuo incompetente para entender o mundo. Penso em quantas coisas estão além do meu entendimento, me sinto um analfabeto em economia, sociologia, política internacional e movimentos sociais. O cara era mesmo uma sumidade. Falava de coisas complicadas, de um modo complicado, mas que tornava tudo simples. O ABC da geopolítica e o uso da tradição histórica para entender o futuro estava no seu DNA, parece que não fazia esforço algum para explicar para pessoas simples como eu como os países estavam se redesenhando, como o mundo se redesenhou após a recessão dos anos 30 reorganizado em torno das direitas, como as esquerdas emergiram, quais seriam nossos próximos passos.

Na faculdade li livros que ele escreveu para tentar entender como as populações se desenvolvem, não é só uma questão econômica, é também social, das periferias e do movimento da especulação imobiliária. Por isso líamos Hobsbawm na arquitetura. Toda vez que alguém no mundo que decide precisava de uma opinião sobre como as coisas estavam evoluindo ou para onde iam, precisava comprovar uma ideia, ou queria mudar um paradigma político, chamava o nome do bom e velho Hobsbawm. Ao final, fiquei ali parado assim pensando... Mas cometi a infeliz ideia de seguir lendo e ir para os comentários de burronaltas, e foi aí que me deparei com o absurdo fenômeno que estamos vivendo.
Algumas pessoas leram o artigo e julgaram que Hobsbawm estivesse (vivo) defendendo ideologicamente o presidente Lula e o Partido dos Trabalhadores. Mesmo que no artigo ele fale em política internacional, na união de Brasil e Argentina no cone Sul para fortalecer a América Latina, na perda da hegemonia do FMI pelo pagamento da dívida por países emergentes, na fase dura das relações diplomáticas nas mãos de Thatcher e Reagan, mesmo assim. Algum despreparado ignorante social só conseguiu entender e se fixar na frase sobre o ex presidente Lula.

Quero só relembrar quem é esse personagem. Hobsbawm foi um dos maiores pensadores da economia e movimentos políticos do século XX, descreveu a história do século XX como ninguém, em associações entre movimentos sociais e políticos, econômicos e de desenvolvimento de uma forma inovadora e esclarecedora. Sempre foi obcecado com a ideia de que entender a história poderia nos levar a planejar e predizer o futuro, analisando o passado, previu situações que se concretizaram no correr da história, sendo a mais famosa a crise de etnias e religiões na região de Israel, escreveu mais de 30 livros. Presidentes do mundo todo iam até Londres para conversarem com ele sobre como a crise ou os movimentos políticos afetariam ou afetarão seus países. E quando leio os comentários da matéria...um cara diz que ele é esclerosado, o outro (que não sabe que limpeza se escreve com z) diz que ele tem Alzheimer (e claro, erra na ortografia), e um terceiro diz que ele foi pago pelo Lula.
Meu Deus!
Que inferno é esse de internet que tenho que aguentar com tanta gente despreparada, ignorante e desrespeitosa? Pobre Eric. Ser assim xingado por um punhado de incompetentes pretenciosos que não tem nem ideia de quem ele foi. Mas esse é o reflexo do povo do país em que vivemos. O povo que tem opinião formada sobre tudo, mas só lê o cabeçalho; que se "politiza" pelo facebook; acha engraçado vaiar a presidenta de seu próprio país diante do mundo num jogo de futebol; que faz manifestações e depois esquece o motivo, que abandona a militância porque perdeu a graça; que vota sem se informar e depois reclama do governo; que esquece em quem votou; que acha que sonegar não é crime (afinal o dinheiro não é usado em nada mesmo, como se calçamento, luz, grama cortada, meio-fio e tudo o mais brotasse da terra). Povo que vota voto de protesto e elege oTiririca, que compra uma revista semanal que mente, e um jornal que elege como o melhor deputado federal do ano de 2012 um ex-BBB e ... Tiririca, o segundo melhor! Sou obrigado a aceitar que precisamos melhorar muito a educação. Vocês tem razão.

Mas também sei dar opinião, leio muito para dar opinião, e se qualquer um pode, também posso. A minha opinião é que a educação tem que começar em casa, em pais presentes; mais diálogo, menos novela; mais análise, menos copia e cola; mais leitura, menos compartilhar. Menos cada um com seus problemas, mais respeito pelo outro; menos mulher pelada, mais livros; menos âncora de telejornal dando opinião, mais direito de resposta. Essa mania hedionda dos brasileiros (muitos, a maioria, infelizmente) de serem irreverentes e não respeitarem as regras, de furar fila para dobrar no semáforo, de fazer dedo de silicone para bater ponto e não precisar dar plantão em hospital, de comprar maconha e reclamar de traficantes, de baixar música sem pagar direitos autorais, de fumar escondido onde é proibido fumar. Isso cansa.

E então, depois que leio um depoimento brilhante de um dos caras mais inteligentes do mundo, um ícone do século XX, algum imbecil qualquer usa a seção de comentários e diz que o filósofo, economista, antropólogo, historiador (que já morreu!) está caduco. Por favor, pára o mundo que eu quero descer!
Hobsbawm, esteja onde estiver, em nome do povo brasileiro, peço desculpas.