terça-feira, 15 de setembro de 2009

Já é Natal! (15 de setembro de 2009)

Ontem vi na televisão o primeiro comercial de Natal. Sério. Nem bem terminamos o 7 de setembro, já entrou uma propaganda de Natal. Ei! Esperem, ainda tem o Dia das Crianças! Que nada, os caras não querem nem saber, é um tal de Papai Noel Apressado. Coitado do Papai Noel, nem bem teve tempo de terminar os brinquedos e entrou nessa roubada de aparecer em um comercial em setembro. Nos anos anteriores, passava um pouquinho do 12 de outubro e as lojas começavam a artilharia de Natal, mas este ano, com crise internacional e aquecimento global, o negócio é mandar bala desde já e começar a correria do fim do ano quatro meses antes. Quanto antes melhor. Mais tempo para me convencerem de que se eu não der presentes que eu não posso pagar para pessoas que não querem ganhar presentes de mim, eu não sou um cara legal. Depois ninguém sabe porque parece que o tempo passa mais rápido hoje em dia.
Nessa nova forma de viver, quase não percebemos o momento atual. Em Excalibur, o Mago Merlin falou para o Rei Artur que o futuro era como um doce, e só se pode saber o gosto dele depois de provar, só que aí, pode ser tarde demais. Artur não quis nem saber, pegou o bafo-do-dragão de Merlin e seduziu a Morgana, depois pagou caro, porque o filho deles se voltou contra ele e quase destruiu o mundo. Se Merlin vivesse nos dias de hoje ia dizer que o futuro é um doce meio comido. Sabe como é? Aquele mil folhas que a gente come metade porque é doce demais e parece que os dentes vão cair, corta um pedaço e mete o resto na geladeira para outra hora? Bem assim.

Não conseguimos mais viver no dia de hoje. Nossos compromissos são marcados com antecedência cada vez maior, então a vida passa de expectativa para expectativa, sempre pensando no próximo momento, no próximo aniversário, nas próximas férias, no próximo feriado, na roupa de amanhã, no que fazer com o próximo salário. E quando o próximo chega, já virou história. O presente acabou.

Viajo toda semana de Brasília para Belo Horizonte e volto. Mais ou menos uma hora de voo. Se eu fosse uma criança de uns seis anos ia pensar que o aeroporto de BH é dentro de Brasília, um cilindro mágico onde eu entro e quando saio o mundo mudou. O resto desaparece. Na esteira da velocidade e do deslocamento, tudo o que existe ao redor vira nada. Não há cidades, não há pessoas, não há atração. Só duas capitais que se encontram por intermédio e um cilindro com asas. Quando entro no aeroporto, espero o embarque, quando embarco, a decolagem. Quando voo, a aterrisagem, e assim por diante. Sempre olhando para a frente e adiante, como no dia a dia com nossos compromissos, e os momentos vão passando por nós numa velocidade assustadora. O mundo não quer mais o agora, quer o amanhã, e amanhã, vai querer o depois. Agora mesmo, que comecei a encerrar este post, já estou pensando na próxima postagem. O futuro foi aqui!
foto: alfredoonline.blogger.com.br - Alessandra Ambrósio

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

O comprimido na minha quadra

Eu conheço uma pessoa que adora pessoas fantasiadas.
Não uma fantasia comum, mas dessas fantasias em que a pessoa fica enorme e tenta simular uma criatura de desenho animado, um bicho ou um cachorro quente, uma garrafa ou uma televisão. Toda vez que estou com ela e ela vê alguém fantasiado ela tem que ir até a pessoa para dar a mão, ou tenho que dar a volta para ela voltar e ver de novo. E lá vamos nós, tudo para uma abanadinha para o fantasiado.

Outro dia saí de casa e caminhando na quadra dei de cara com um comprimido. Não um comprimido no chão, mas um cara vestido de comprimido. E lá vou eu, buscar pão as nove da manhã de sábado, e lá vem ele, o comprimido. Foi uma situação constrangedora. Primeiro porque não existe um motivo lógico para alguém se fantasiar de comprimido; segundo, porque estávamos só nós dois, em direções opostas, na mesma calçada de três metros de largura.Se caminhar em direção a outra pessoa em uma rua onde você não tem para onde olhar, as vezes é constrangedor, imagine caminhar em direção ao comprimido.

Andar fantasiado pressupõe algumas qualidades, você deve estar disposto a ouvir piadinhas, a ser simpático com todos, então, o mínimo que eu poderia esperar do comprimido era um pouco de profissionalismo, que fosse simpático e me cumprimentasse. Ele era vermelho, da cintura para cima, com calça leg azul e pés enormes almofadados. E eu. Se você não sabe, sou um cara muito envergonhado. No começo fingi que não estava vendo, mas não tem como não ver uma almofada redonda em forma de comprimido com um metro e meio de diâmetro a vinte metros de você. Depois, assumi um ar cool, de cara descolado que já viu tudo na vida, e comecei a ignorar a fantasia. Também não deu certo, porque me senti um lunático que não diferencia o que é real do que é uma alucinação. E então tive um breve surto que durou alguns segundos, diante da possibilidade de estar realmente ficando maluco ou mesmo de ainda estar dormindo e tudo ser um sonho estúpido. Quando cruzei pelo comprimido já estava disposto a acenar um sorrisinho básico do tipo "ok, você está ridículo, mas afinal, isto é somente um trabalho", quando o comprimido abaixou a cabeça e começou a ler um panfleto. Não era possível. O comprimido estava me ignorando!

Continuei caminhando, nos cruzamos, e dei uma olhada para trás. Ele não lia mais. Parei na calçada, nada. Eu não existi para ele. Talvez no universo dos comprimidos eu fosse uma coisa estranha fantasiada de pessoa, andando de manhã cedo pelo meio da rua.

Voltei para casa peguei o carro para ir a algum lugar. Claro, acabei dirigindo ao redor da quadra porque queria ver o comprimido de novo, mas nada. Do jeito que o mundo é estranho, ele deve ter sido engolido por alguém fantasiado de ogro.

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Teoria Universal da Perversidade dos Materiais

Em algum lugar fica alguém que decide como as coisas vão acontecer. Chame de Deus, destino, acaso ou o que quiser, mas essa coisa tem mesmo esse poder todo. Não fosse assim, quando eu comprei o edrédon porque fazia um frio desgraçado em BH, o frio teria durado pelo menos mais de três dias, o que não aconteceu. Quando eu comprei um guarda-chuva, parou de chover. Mudei para um apartamento no décimo andar, sem ninguém em cima para perturbar, e tem uma zona do outro lado da avenida perpendicular à minha rua e o barulho vem todo parar na minha sala (no bairro mais nobre de BH), a gente compra passagem para o último vôo e atrasa, compra para o primeiro e não tem teto. Alguém, alguma coisa, em algum lugar decidiu que nessa hora, nesse dia ou nesse ano, você iria se dar mal. Isso já aconteceu com todo mundo, chame de azar, falta de sorte, coincidência, mas eu tenho certeza que é proposital. A máquina de lavar que funciona quando chega o técnico, a TV que volta ao ar quando chega o cara do cabo, sua caneta que não escreve quando você precisa anotar o telefone, a bateria do celular bipando, a fila no trânsito que não anda, o papel higiênico que desapareceu, a roupa perfeita para o evento que está suja, o gás que acaba, o tomate que falta para o molho, a farinha do churrasco com bichinhos dentro ou o ovo para o omelete. Isso não pode ser coincidência, faz parte de um grande plano universal para tornar a vida das pessoas mais selvagem, um plano chamado Teoria Universal da Perversidade dos Materiais. É ele quem faz desaparecer sua chave dentro da bolsa, a caneta de cima da mesa, sua carteira quando você sai de casa atrasado, o congestionamento porque um cara esqueceu de colocar gasolina, o elevador estragado, o grampo do grampeador que acaba, o papel do xerox que entope, o computador que trava, os táxis que desaparecerem, a chuva que para, a chuva que começa. Tenho certeza de que existe um exército organizado e impetuoso por detrás disso tudo, elaborando, articulando, projetando, planejando para tornar pequenos eventos cotidianos em infernos permanentes. Mas de tudo, nos resta aceitar, procurar as chaves, sair em busca do gás, desistir do omelete, encaixotar o edrédon. O universo é aqui.