TOYS ARE US
Sempre gostei de brinquedos que falavam comigo. Não esses em que bastava apertar um botão para ouvir uma frase pronta, mas aqueles silenciosos que me deixavam usá-los e falar por eles. Havia os brinquedos em que tudo o que se tinha de fazer era apertar um botão, girar uma alavanca ou pressionar uma tecla para que brincassem sozinhos. Brinquedos egoístas, independentes, cuja alegria e o divertimento estava dentro deles mesmos. Nunca tive desses que achavam a presença de uma criança um fardo. Tenho a sensação de que um brinquedos assim devia suspirar em seu íntimo de plástico algo como “que chatice, lá vem aquele garoto me apertar outra vez", e depois disso, apertado o botão correto, o brinquedo saia brincando sozinho, como se o menino jamais existisse, e os olhos iam seguindo o objeto, muito mais na inércia do que na imaginação. Sempre preferi aqueles que dependiam de mim para serem felizes. No tempo em que matar índios era divertido e incentivado, minha cavalaria, comandada pelo invencível general Custer (que depois descobri que foi massacrado em Little Big Horn) caçava até o ultimo índio que rondasse o tapete oval da sala. Não satisfeita, a cavalaria chamava o exército, e os pobres índios nao tinham mais vez. Também havia os animais selvagens, que meus soldados caçavam pela selva, animais sempre rebeldes que queriam destruir o acampamento dos pobres soldados. E não havendo índios, cavalos de plástico, soldados ou pistoleiros, eram latas, tampas, potes, cones de lã. Tudo o que pudesse ser algo mais do que era, brinquedos com os quais eu imaginava, conversava e que me respondiam. Respondiam com aventura, com empolgação, com criatividade e ficção. Eram bons amigos. Hoje os brinquedos bastam em si, para a geração de pequenos gênios e espetaculares crianças prodígio, uma tela touch já é o suficiente. Basta alguns apertões na sequencia correta e muitas cores explodem na tela, aventuras, bonecos animados. Mas quem brinca é o brinquedo, não a criança. É como se alguém comesse o churrasco por vc: vc sente o cheiro, vê a textura, observa o corte perfeito, mas não mastiga nada. Espero que um dia essas crianças tenham imaginação suficiente para solucionar os problemas do mundo, pelo menos alguns, porque a minha geração, com toda nossa criatividade e expostos aos mais complexos problemas físicos e mecânicos do cotidiano, não fomos capazes. Se piorar, sempre haverá a chance de recomeçar a grande brincadeira da humanidade, basta pressionar um botão.
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