quinta-feira, 12 de junho de 2008

The Harlem

Essa semana uns bons amigos de Brasília vieram para New York. Marcamos um encontro na sexta à noite e jantamos juntos no Chow, um restaurante de moderna cozinha Tai, com uma ótima comida em um ambiente cheio de gente bonita no Greenwich Village. Depois caminhamos por ali e deixei eles em casa perto da Washington Place, a praça que tem o Arco do Triunfo, onde Bob Dylan começou sua carreira musical cantando em troca de moedas para as pessoas que levavam as crianças para passear. Tentei pegar um táxi para casa, mas foi impossível, a disputa estava fortíssima, era meia noite, e precisei caminhar até o metrô e pegar um trem para casa.


Sábado cada um foi para seu lado (eu e meus amigos) . Fui na Ponte do Brooklyn, uma impressionante estrutura sustentada por cabos com a extensão de mais de 1600 metros. É possível atravessar a Brooklyn Bridge a pé ou de bicicleta de maneira absolutamente segura. A ponte, de 1883, teve sua estrutura recuperada durante a gestão do famoso prefeito novaiorquino Rudolph Giulliani, aquele do Tolerância Zero. Lá de cima pode-se ter boas visuais de Chinatown e do Skyline de NY. Também avistei o Píer 17, e depois desci lá para visitar. Um conjunto urbano do início do século XX, ao lado do Rio Hudson, que mantém as características portuárias, mas foi totalmente restaurado com restaurantes, lojas, espaço de espetáculos e museu.


Domingo marquei de encontrar esses amigos no Harlem para o brunch. O local escolhido foi o Sylvia´s - Queen of South Food, um restaurante tradicional com gospel brunch, ou seja, almoço cedo ou café da manhã tarde, com música gospel ao vivo. O lugar não é muito grande, mas a comida, The Talked About Barbecue Ribs (o falado churrasco de costelinhas com molho barbecue) é muito boa. O som também era legal, uma mistura de gospel americano, soul e Rythm and Blues.


Depois do almoço, uma volta pelo Harlem. Quando Bill Clinton deixou a presidência dos EUA instalou seu escritório em uma área do Harlem para ajudar a revitalizar a região, que já foi uma das mais ricas da cidade e é uma das mais antigas zonas residenciais. A coisa deu certo, o Harlem é um lugar muito tranquilo e movimentado, obviamente não foi só por isto, mas foi uma demonstração de confiança. Mesmo estando nos anos 2000, ainda se sente um pouco a pressão da segregação que ocorreu ali e resultou em manifestações nos anos 40 e violentos conflitos raciais nos anos 60 e 70. Preconceito é um bicho selvagem que vive dentro das pessoas e se alimenta da dignidade dos outros. De resto, o Harlem tem uma arquitetura espetacular para quem curte o ecletismo, totalmente vitoriana, com casas de tijolos marrons e vermelhos, com senhoras bem arrumadas e grandes chapéus indo para a Igreja.



Passamos pelo Lenox Lounge, uma casa noturna de grandes personalidades do Blues e do Jazz, que existe desde 1939 (também é conhecido como Zebra Room) com sua guitarra pendurada na vitrine. Depois pelo Apollo Theater, onde existe até hoje a free wednesday (quarta livre) para amadores se apresentarem e descobridores de talento tentarem ficar milionários. Alguns dos nomes que foram descobertos nessa quarta livre incluem Jackson Five, Marvin Gaye e James Brown, se você não ouviu falar deles, deve ter desembarcado de Marte faz pouco tempo. O Apollo é uma instituição do Harlem. Na esquina da Lennox Avenue, rebatizada de Malcom X Boulevard, o edifício que tomou o lugar da livraria onde Malcom X iniciou suas manifestações por igualdade. Na esquina da Malcom X com a Martin Luther King Jr, não resistimos e tiramos uma foto.



No meio da tarde voltei para casa, o Harlem é legal, dali surgiram movimentos que mexeram com a sociedade e com a cultura, além do conceito de direitos humanos e liberdade a partir do final dos anos 30, novos ritmos que influenciaram a música de diferentes maneiras. Caminhando nas ruas do Harlem, me senti um intruso curioso em um espaço que foi conquistado com muita luta e sofrimento. Pior do que isto, me senti desconfortável em pensar que um dia essas mesmas pessoas foram obrigadas a se refugiarem ali, separadas de outras pessoas pela quantidade de melanina na pele. O Harlem tem uma energia muito forte, mas é um gueto que não precisava ter acontecido. Preconceito é mesmo uma coisa estúpida.

* Esta postagem é de 04 de maio de 2008

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